Renato Nitta

Coronavírus: Porque você deveria agir agora

Coronavirus: Porque você deveria agir agora

Hoje, sábado dia 14 de Março de 2020, acordei cedo e me preparava para levar meus filhos ao futebol, mas me deparei com uma publicação no Twitter, que apontava para um artigo no Medium sobre o coronavirus.

Após ler parte do artigo, tomei a decisão de não levar meus filhos ao futebol, pois haveria aglomeração de pessoas. Eles não gostaram é claro, mas fiz o que achei correto.

Depois de um tempo, li o artigo completo e resolvi fazer uma tradução para o português brasileiro.


Tradução do artigo:
https://medium.com/@tomaspueyo/coronavirus-act-today-or-people-will-die-f4d3d9cd99ca

Autor original: Tomas Pueyo


Com tudo o que tem acontecido a respeito do Coronavirus, não é fácil decidir sobre o que fazer no momento.
Devo aguardar por mais informações?
Devo fazer algo hoje?
Mas o quê?

Estes são os tópicos que pretendo cobrir com este artigo, com muitos gráficos (em inglês), modelos de dados e muitas fontes de informação:

Quando terminar de ler este artigo, estará ciente que:

O Coronavirus está chegando até você.
Está chegando com uma velocidade exponencial: começa gradual e depois aumenta subitamente.
É uma questão de dias, uma semana ou duas talvez.
Quando acontecer, o sistema de saúde vai sobrecarregar.
Seus colegas e vizinhos serão tratados nos corredores.
Exaustos, os trabalhadores da saúde vão se esgotar e alguns vão morrer.
Eles terão que decidir por exemplo quais pacientes vão receber oxigênio e quais vão morrer.
O único jeito de prevenir este cenário é: distanciamento social, hoje.
Não amanhã. Hoje.
Isto significa manter o máximo possível de pessoas em casa, começando agora.

Como político, líder de comunidade ou líder de empresas, você tem o poder e a responsabilidade de evitar isso.

Você pode ter receios como: E se eu me precipitar? As pessoas vão rir de mim? Elas ficarão com raiva? Vou parecer um tolo? Não seria melhor esperar os outros tomarem uma iniciativa? Será que posso afetar demais a economia?

Mas em questão de 2 a 4 semanas, quando o mundo inteiro estiver em isolamento, quando os primeiros e preciosos dias de distanciamento social que você possibilitou tiver salvo vidas, as pessoas não mais lhe criticarão: Elas vão te agradecer por ter tomado uma decisão.

OK, vamos lá.

1. Quantos casos de Coronavirus haverão em sua região?

Crescimento por país

O número total de casos cresceu exponencialmente na China, até que conseguiram conter o quadro.
Mas aí, acabou vazando para o mundo e se tornou uma pandemia que ninguém consegue parar.

No momento, com mais foco na Itália, Irã e Coreia do Sul.

Há muitos casos na Coreia do Sul, Itália e Irã, ainda é difícil enxergar os outros países, mas vamos olhar de perto o canto inferior direito do gráfico.

Há dezenas de países com taxas exponenciais de crescimento de casos. No momento a maioria são ocidentais.

Se manter a mesma taxa de crescimento por apenas uma semana, isto é o que teremos:

Se quisermos entender o que vai acontecer ou como prevenir, devemos olhar para os casos de quem já passou por isso: China, países Ocidentais que tiveram experiência prévia com SARS e Itália por exemplo.

China

Este é um dos gráficos mais importantes.

Ele mostra com barras em laranja o número oficial de casos na província de Hubei: Quantas pessoas foram diagnosticadas naquele dia.

A barras em cinza mostram o número real de casos. O órgão chinês CDC levantou estes dados perguntando aos pacientes quando os sintomas começaram.

Crucialmente, esses casos reais não eram conhecidos na época. Nós só conseguimos entender olhando para trás: As autoridades não sabem que alguém começou a apresentar os sintomas. Eles só sabem quando alguém vai ao médico e é diagnosticado.

Isto significa que as barras laranja mostram o que as autoridades sabem, enquanto as barras cinza mostram o que estava realmente acontecendo.

No dia 21 de Janeiro, o número de novos casos diagnosticados (em laranja) estava estourando: havia em média 100 novos casos. Na realidade, haviam 1.500 novos casos naquele dia, crescendo exponencialmente. Mas as autoridades não sabiam disso. O que eles sabiam é que haviam 100 novos casos desta nova doença.

Dois dias depois, autoridades isolaram Wuhan. Naquele momento, o número de novos casos diagnosticados por dia era por volta de 400.
Preste atenção no número: eles tomaram a decisão de isolar a cidade com apenas 400 novos casos por dia. Na realidade, eram 2.500 novos casos por dia, mas eles não sabiam disso.

Um dia depois, mais 15 cidades na província de Hubei foram isoladas.

Até 23 de Janeiro, quando Wuhan foi isolada, você pode olhar para o gráfico cinza: que cresce exponencialmente. Os casos reais estavam explodindo. Assim que Wuhan é isolada, os casos diminuem.
Em 24 de Janeiro, quando outras 15 cidades foram isoladas, o número de casos reais (em cinza) novamente tiveram uma parada.
Dois dias depois, o número máximo de casos reais foi alcançado e os números vem diminuindo desde então.

Perceba que as barras laranja, número oficial de casos continuam crescendo exponencialmente: Por mais 12 dias, a impressão era que explodiria. Mas não foi o caso. Eram os casos ganhando sintomas mais fortes e visitando mais os médicos, assim o sistema os identificava.

Este conceito de casos oficiais de casos reais é importante. Vamos manter isto na cabeça para depois.

O restante da China estava sendo bem coordenada pelo governo central, então eles tomaram medidas drásticas.
Este foi o resultado:

Cada linha mais horizontal é uma região da China com casos de coronavirus. Cada uma tem o potencial de se tornar exponencial, mas graças as medidas tomadas no final de Janeiro, todas elas pararam o vírus antes que ele pudesse se espalhar.

Países Orientais

Os casos na Coréia do Sul explodiram, mas você parou para pensar por quê no Japão, Taiwan, Singapura, Tailândia e Hong Kong não?

Todos eles foram afetados pelo SARS em 2003, todos eles aprenderam com isto. Eles aprenderam o quão viral e letal isto pode ficar, então eles sabiam que deveriam levar a sério. É por isto que o gráfico deles, apesar de começar a crescer bem antes, ainda não parecem exponenciais.

Até agora nós temos histórias onde o número de casos de coronavírus estão estourando, governos percebendo a ameaça e contendo os casos. Porém em os outros países, a história é completamente diferente.

Antes de falarmos desses países, uma observação sobre a Coreia do Sul: O país é provavelmente um ponto fora da curva, uma exceção. O coronavírus foi contido pelos primeiros 30 casos. Então o Paciente 31 foi um super contagiante que espalhou para milhares de pessoas.
Isto porque o vírus espalhou antes das pessoas mostrarem sintomas, quando as autoridades perceberam o problema, o vírus já tinha alastrado. Eles estão lidando com as consequências e pagando por aquele único acontecimento. De qualquer forma, os esforços de contenção deles se mostraram eficazes: a Itália por exemplo passou a Coreia do Sul em número de casos, o Irã deve passar amanhã, dia 10/03/2020.

O Estado de Washington

Você já deve ter visto sobre o crescimento nos países Ocidentais e como as previsões para a semana seguinte estão ruins. Agora imagine se a contenção não acontecer como aconteceu em Wuhan ou nos países Ocidentais mencionados acima, logo você verá uma epidemia colossal.

Vamos olhar alguns casos como o Estado de Washington, São Francisco (bay area), Paris e Madrid.

O Estado de Washington é como se fosse a Wuhan americana. O número de casos está crescendo exponencialmente por lá. No momento são 140.

Mas um fato interessante aconteceu logo no início. A taxa de mortalidade foi para as alturas. Em um certo ponto, para cada 3 casos, o estado tinha uma morte.

Nós sabemos que em outros lugares a taxa de mortalidade do coronavírus é de aproximadamente 0.5% e 5% (falaremos mais sobre isto).
Como pode a taxa de mortalidade chegar a 33%?

Acontece que o vírus foi se espalhando sem ser detectado por semanas. Não é que haviam apenas 3 casos. É que as autoridades só tinham conhecimento de 3 casos, sendo que uma delas acabava falecendo.
Quanto mais sério ficam as condições de saúde, a probabilidade de alguém ser examinado e diagnosticado é maior.

Este caso se parece um pouco com as barras laranja e cinza na China: Só que em Washington eles só sabiam sobre as barras laranja (casos oficiais) e achavam que estava tudo bem, apenas 3 casos. Quando na realidade eram centenas, talvez milhares de casos reais.

Isto é um problema: Nós só sabemos os casos oficiais, não os casos reais. Mas precisamos saber os casos reais. Como podemos estimar os casos reais? Há algumas maneiras. E eu tenho um modelo para elas, então você pode brincar com os números também (link direto para o modelo, em inglês).

Primeiro, através das mortes. Se você tem casos com mortes em sua região, você pode usar este dado para estimar o número de casos reais atuais. Nós sabemos aproximadamente quanto tempo leva para uma pessoa adquirir o vírus e vir a falecer, em média (17.3) dias. Isto significa que se uma pessoa morreu em 29/02 no Estado de Washington, provavelmente foi infectada por volta de 12/02.

Então, sabemos o índice de mortalidade. Para este cenário, estou usando 1% (vamos discutir em detalhes depois). Isto significa que, perto de 12/02, haviam por volta de 100 casos nessa região (onde apenas um veio a falecer após 17.3 dias).

Agora usamos a média de tempo que se leva para duplicar os casos de coronavírus, em média: 6.2 dias. Isto significa que, nos 17 dias que esta pessoa levou para falecer, os casos multiplicaram por 8 (=2^(17/6)). Sendo assim, se não estamos diagnosticando todos os casos, uma morte significa 800 casos reais no dia de hoje.

O Estado de Washington teve 22 mortes até hoje. Com este cálculo, temos 16.000 casos reais de coronavírus. O mesmo que os casos oficiais na Itália e Irã somados.

Se olharmos em detalhes, é possível que 19 dessas mortes foram dentro de um mesmo grupo e possivelmente não ter espalhado o vírus amplamente. Então, se considerarmos 19 mortes como uma, o número total de mortes no estado é de 4. Atualizando o modelo com este valor, ainda temos 3.000 casos hoje.

Esta abordagem de Trevor Bedford olha para o vírus e suas mutações para chegar no número de casos atuais.

A conclusão é que temos 1.100 casos no Estado de Washington no momento.

Nenhuma dessas abordagens é perfeita, mas todas elas apontam para a mesma mensagem: Nós não sabemos o número de casos reais, mas eles são bem maiores que os casos oficiais. Não em centenas. Em milhares, talvez até mais.

São Francisco (Bay Area)

Até dia 08/03, São Francisco (Bay Area) não teve nenhuma morte. Isso dificultou a estimativa de quantos casos reiais temos por lá. Oficialmente, são 86 casos. Mas os Estados Unidos estão examinando um número muito baixo de casos por falta de material, kits para diagnosticar. O país resolveu criar seu próprio kit de exame, que acabou não funcionando.

Este era o número de exames realizados nos diferentes países em 03 de Março:

A Turquia, com nenhum caso de coronavírus, realizou 10 vezes mais exames por habitante que os Estados Unidos. A situação não é muito melhor hoje, com 8.000 exames realizados nos EUA, o que significa que 4.000 pessoas foram examinadas.

Neste caso, podemos usar apenas uma parte dos casos oficiais para os casos reais. Como decidir quais? Para São Francisco, eles estavam examinando todos os que viajaram ou tiveram contato com viajantes, o que significa que eles sabiam apenas os casos relacionados a viagens, mas nenhum dos casos de contágio na comunidade local.
Tendo um senso de casos de contágio na comunidade local vs. casos de contágio por viagem, conseguimos saber quantos casos reais há por ali.

Eu olhei na taxa da Coreia do Sul, que possui bons dados. Da época que em que eles tinham 86 casos, a porcentagem de contágio pela comunidade local era de 86% (86 casos e 86% foi coincidência).

Com este número, podemos calcular o número de casos reais. Se em São Francisco há 86 casos hoje, isto indica que o número real é por volta de 600.

França e Paris

A França diz que possui 1.400 casos hoje e 30 mortes. Usando o dois métodos acima, podemos chegar em algo como: entre 24.000 e 140.000.

O número de casos reais de coronavírus na França hoje provavelmente fica entre 24.000 e 140.000.

Deixa eu repetir: o número de casos reais de coronavírus na França hoje é de duas ordens de magnitude a mais que a reportada oficialmente.

Não acredita em mim? Vamos olhar para Wuhan novamente.

Se juntarmos as barras laranja até dia 22/01, temos 444 casos. Agora adicione todas as barras cinza. Elas acrescentam 12.000 casos. Então, quando Wuhan pensava que tinha 444 casos, tinha 27 vezes mais. Se a França acha que tem 1.400 casos, pode haver dezenas de milhares.

A mesma matemática se aplica a Paris, Com 30 casos dentro da cidade, o número real de casos pode ser de centenas, talvez milhares. Com 300 casos na região Ele-de-France, o número total de casos já pode ter ultrapassado dezenas de milhares.

Espanha e Madrid

A Espanha possui números similares a França (1.200 casos vs. 1.400, e ambos com 30 mortes). Isto significa que as mesmas regras são válidas: a Espanha tem provavelmente acima de 20.000 casos reais atualmente.

Na região de Madrid, com 600 casos oficiais e 17 mortes, o número de casos reais é algo entre 10.000 e 60.000.

Se você lê esses dados e pensa: “Impossível, isto não pode ser verdade”, lembre do seguinte: Com esses números Wuhan já estava isolada.

Com o mesmo número de casos de hoje em países como EUA, Espanha, França, Irã, Alemanha, Japão, Holanda, Dinamarca, Suécia ou Suíça, Wuhan já estava isolada.

E se você está falando: “Bem, Hubei é apenas uma região, uma província”, deixa eu te lembrar que há por volta de 60 milhões de pessoas por lá, maior que a Espanha e mais ou menos o tamanho da França em número de habitantes.

2. O que vai acontecer quando esses casos de coronavírus se materializarem?

Então o coronavírus já está aqui. Está escondido e crescendo exponencialmente.

O que acontecerá em nossos países quando chegar forte? É fácil saber, porque já está acontecendo em vários lugares. Os melhores exemplos são Hubei e Itália.

Índice de fatalidade

A Organização Mundial da Saúde (OMS) diz algo entre 3.4% de índice de fatalidade (porcentagem de pessoas que contraem o vírus e acabam morrendo). Este número está fora de contexto, deixa eu explicar.

Na verdade, depende do país e do momento: entre 0.6% na Coreia do Sul e 4.4% no Irã. Como assim? Nós podemos usar um truque para descobrir.

Os dois métodos para calcular índice de fatalidade é Mortes/Total de Casos e Mortes/Casos Controlados. O primeiro provavelmente é subestimado, por causa dos muitos casos em aberto que ainda podem acabar em morte. O segundo é superestimado porque parece que os casos de mortes são mais rápidos que os casos de recuperação.

O que fiz foi olhar como ambos se desenvolvem com o tempo. Ambos os números vão convergir quando todos os casos chegarem a uma conclusão, então se projetarmos tendências passadas para o futuro, podemos fazer uma estimativa de qual será o índice de fatalidade real.

Isto é o que podemos ver nos dados. O índice de fatalidade na China atualmente é de 3.6% e 6.1%. Se projetarmos para o futuro, provavelmente irá convergir para 3.8%-4%. Isto é o dobro da estimativa atual, e 30 vezes pior que a influenza.

Este dado é composto por duas realidades completamente diferentes: Hubei e o resto da China.

O índice de fatalidade de Hubei provavelmente vai convergir para 4.8%.
Enquanto isso, para o resto da China, deve convergir para 0.9%:

Eu também fiz gráficos para os números do Irã, Itália e Coreia do Sul, os únicos países com dados suficientes para deixar o gráfico relevante de alguma forma.

Tanto para o Irã como para Itália, o número de Mortes/Total de Casos estão convergindo para 3%-4%. Minha suspeita é que os números vão acabar por volta disso também.

A Coreia do Sul é o exemplo mais interessante, porque esses dois números estão muito desconectados: (mortes/total de casos) é apenas 0.6%, mas (mortes/casos controlados) são enormes 48%. Minha opinião é que alguns fatos únicos estão acontecendo por lá.
Primeiro, eles estão examinando todo mundo (com tantos casos abertos, o número de mortes parece baixo), e estão deixando os casos abertos por mais tempo (eles encerram rápido quando os pacientes morrem).
Segundo ponto, eles possuem muitos leitos em hospitais (veja o gráfico 17.b).
Deve haver também outros motivos que não sabemos.
O que é relevante é que (mortes/casos) oscilou em torno de 0.5% desde o começo, sugerindo que vai continuar por ali, provavelmente influenciado fortemente pelo sistema de saúde e gerenciamento de crises.

O último exemplo relevante é o cruzeiro Diamond Princess: com 706 casos, 6 mortes e 100 recuperações, o índice de fatalidade será entre 1% e 6.5%.

Observe que a distribuição etária em cada país também gera impacto nos números: levando em conta que a mortalidade é mais alta em pessoas de idade, países com idade média mais alta como o Japão terão índices mais altos que países mais jovens como Nigéria. Também há fatores meteorológicos, especialmente umidade e temperatura, mas ainda não está claro como isso irá impactar nos índices de fatalidade.

Isto é o que podemos concluir:

Coloquemos de uma outra forma: Países que agirem rápido podem reduzir o número de mortes por um fator de 10. E estamos falando apenas do índice de fatalidade. Agir rápido também reduz drasticamente o número de casos, fazendo disso ainda mais essencial.

Países que agirem rápido poderão reduzir o número de mortes por 10x.

Então o que um país precisa para estar preparado?

Qual será o impacto no sistema

Por volta de 20% dos casos necessitam internação, 5% dos casos precisam de UTI, e por volta de 2.5% precisam de ajuda mais intensiva, com itens como inaladores ou ECMO (Oxigenação por membrana extracorpórea).

O problema é que equipamentos como inaladores e ECMO não podem ser produzidos ou comprados facilmente. Alguns anos atrás, os EUA possuíam um total de 250 máquinas de ECMO, por exemplo.

Então se de repente temos 100.000 pessoas infectadas, muitas delas serão examinadas. Por volta de 20.000 vão precisar de internação, 5.000 vão precisar de UTI, e 1.000 vão precisar de equipamentos que nós não temos o suficiente hoje. Isto contando apenas 100.000 casos.

Isto sem contar itens como máscaras. Um país como os EUA tem apenas 1% das máscaras necessárias para cobrir a demanda dos seus trabalhadores da saúde (12M N95, 30M cirúrgicos vs. 3.5B necessário).
Se muitos casos aparecerem de uma vez, haverá máscaras para apenas 2 semanas.

Países como o Japão, Coreia do Sul, Hong Kong ou Singapura, assim como as regiões da China fora de Hubei, estavam preparados e proveram o que os pacientes precisavam.

Mas e o resto dos países Ocidentais estão indo no mesmo caminho de Hubei e da Itália. Então o que está acontecendo por lá?

Como fica um sistema de saúde sobrecarregado

As histórias que aconteceram em Hubei e na Itália estão começando a ficar parecidas. Hubei construiu dois hospitais em dez dias, mas mesmo assim, seu sistema ficou completamente sobrecarregado.

Ambos reclamaram que os pacientes inundaram seus hospitais. Eles tinham que tratá-los em qualquer lugar: nos corredores, nas salas de espera…

Eu recomendo esta curta conversa no Twitter. Ela ilustra bem a situação na Itália hoje

Notícia em italiano
Coronavirus a Bergamo, medico Humanitas su Facebook: «Situazione drammatica, altro che normale influenza»

Trabalhadores da saúde passam horas com um único uniforme de proteção, pois não há o suficiente. Como resultado, eles não conseguem sair das áreas infectadas por horas. Quando conseguem, desmoronam, desidratados e exaustos. Turnos não existem mais. Pessoas são trazidas de volta ao trabalho de suas aposentadorias para cobrir a demanda. Pessoas que não sabem nada sobre enfermagem são treinadas da noite para dia para preencher posições críticas. Todos ficam de plantão, sempre.

Isto é, até que eles fiquem doentes. O que acontece e muito, porque eles estão em constante exposição ao vírus, sem uniformes de proteção suficientes. Quando isto acontece, eles precisam ficar de quarentena por 14 dias, período em que eles não podem ajudar.
No melhor dos casos, 2 semanas perdidas.
No pior dos casos, eles morrem.

O pior é dentro das UTIs, quando pacientes precisam compartilhar inaladores ou ECMOs. Que na verdade são impossíveis de se compartilhar, então os trabalhadores da saúde precisam decidir qual paciente irá usar. Isto realmente significa, quem vive e quem morre.

Notícia em inglês:
Coronavirus: ‘We must choose who to treat,’ says Italian doctor

Depois de alguns dias, nós tínhamos que escolher. […] Nem todo mundo podia ser entubado. Nós decidíamos baseado na idade e no estado de saúde.

—Christian Salaroli, Médico italiano

Tudo isso é o que leva um sistema ter índice de fatalidade de 4% ao invés de 0.5%.
Se você quer sua cidade ou seu país fazendo parte dos 4%, não faça nada hoje.

3. O que você deve fazer?

Alinhar a curva

Já é uma pandemia. Não pode ser eliminada. Mas podemos reduzir os impactos.

Alguns países estão sendo exemplares neste quesito. O melhor exemplo é Taiwan, que é extremamente conectado com a China e ainda hoje, possui menos de 50 casos. Este estudo recente exemplifica todas as medidas que eles tomaram desde o início, que foi focar na contenção.

Estudo (em inglês):
Response to COVID-19 in Taiwan
Big Data Analytics, New Technology, and Proactive Testing

Eles foram capazes de conter, mas muitos países não possuem tal experiência não conseguiram fazer o mesmo. Agora, eles estão jogando um jogo diferente: mitigação. Eles precisam tornar o vírus tão inofensivo quanto possível.

Se reduzirmos as infecções o quanto possível, nosso sistema de saúde será capaz de lidar com casos muito melhor, trazendo o índice de fatalidade para baixo. Além disso, se ganharmos tempos, chegaremos em um ponto onde o resto da sociedade poderá estar vacinada, eliminando o risco completamente.
Então nosso objetivo não é eliminar o contágio do coronavírus.
É adiá-lo.

Quanto mais adiarmos os casos, melhor o sistema de saúde consegue funcionar, menor o índice de fatalidade e maior o número de pessoas que serão vacinadas antes de serem infectadas.

Como alinhar a curva?

Distanciamento social

Há uma coisa muito simples que podemos fazer e que funciona: distanciamento social.

Se você voltar para o gráfico de Wuhan, vai relembrar que assim que houve um isolamento, o número de casos caiu. Isto é porque as pessoas não interagiam umas com as outras e o vírus não espalhou.

O consenso científico atual é que o vírus pode ser transmitido em até 2 metros, se alguém tossir. Caso contrário, as gotículas caem no chão e não infectam.

A pior infecção é a quem vem pelas superfícies: O vírus sobrevive por até 9 dias em diferentes superfícies como metal, cerâmica e plásticos.
Isto significa que objetos como fechaduras, mesas, ou botões de elevador podem ser potenciais vetores de infecção.

A única maneira de realmente reduzir o risco é distanciamento social: Manter as pessoas em casa o quanto possível, por quanto tempo possível até que o vírus recue.

Isto já foi provado no passado. Mais precisamente na pandemia de influenza de 1918.

Aprendizados da pandemia de Influenza de 1918

Podemos ver que a Philadelphia não agiu rápido e teve um pico massivo no número de mortes. Compare com St Louis, que agiu rápido.

Depois olha para Denver, que decretou medidas e depois liberou.
Eles tiveram dois picos, com o segundo sendo maior que o primeiro.

Se generalizarmos, isto é que temos:

Este gráfico mostra, que para a Influenza de 1918 nos EUA, o número de mortes por cidade dependia de quão rápido as medidas foram tomadas. Por exemplo, a cidade de St Louis, tomou medidas 6 dias antes de Pittsburg, e teve menos que a metade de mortes. Na média, tomando medidas 20 dias antes cortou pela metade o número de mortes.

A Itália finalmente chegou a esta conclusão. Primeiro eles isolaram a Lombardia no Domingo, e um dia depois, na Segunda-feira, eles perceberam o erro e resolveram isolar país inteiro.

Felizmente, nós veremos os resultados nos dias a seguir. No entanto, levará uma ou duas semanas para percebermos. Lembre-se do gráfico de Wuhan: houve um atraso de 12 dias entre o anúncio dos isolamentos e o momento em que o número de casos oficiais (em laranja) começaram a cair.

Como políticos podem contribuir para o distanciamento social?

A pergunta que os políticos estão se fazendo hoje não é se eles devem fazer algo, mas qual é a atitude apropriada a se tomar.

Há vários estágios para se controlar uma epidemia, começando com a antecipação e terminando com a erradicação. Mas hoje já é muito tarde para a maioria das opções. Com este nível de casos, as duas únicas opções que políticos ainda possuem são contenção e mitigação.

Contenção

Contenção é garantir que todos os casos sejam identificados, controlados e isolados. É o que Singapura, Hong Kong, Japão e Taiwan estão fazendo tão bem: Eles rapidamente limitaram o número de pessoas entrando no país, identificaram os doentes, isolaram imediatamente, usaram trajes de proteção eficientes para os trabalhadores da saúde, acompanharam todos os contatos dos infectados e os deixaram de quarentena…
Isto funciona extremamente bem quando você está preparado e age logo no início, e não precisa afetar sua economia para que isto ocorra.

Eu já elogiei a abordagem de Taiwan. Mas a abordagem da China é muito boa. O ponto que eles atingiram para conter o vírus é surpreendente. Por exemplo, eles tiveram até 1.800 times de 5 pessoas, cada um acompanhando cada pessoa infectada, todas as pessoas com quem eles interagiram e isolando o grupo. Assim eles foram capazes de conter o vírus em um país de mais de um bilhão de pessoas.

Os Países Ocidentais não fizeram isso. E agora é tarde demais. O recente anúncio americano de que a maioria das viagens da Europa foi banida é uma medida de contenção para um país que possui 3 vezes mais casos que Hubei tinha quando foi isolada, e crescendo exponencialmente.
Como podemos saber se é o suficiente? Acontece que podemos saber olhando para a proibição de viagens em Wuhan.

Este gráfico mostra o impacto que as restrições de viagens tiveram em atrasar a epidemia em Wuhan. O tamanho da bolinhas ilustram o número de casos diários. A linha superior mostra o número de casos se nada fosse feito. As outras linhas mostram os impactos se 40% e 90% das viagens fossem eliminadas. Este é um modelo criado por epidemiologistas, porque nós temos como saber com precisão.

Se você não vê muita diferença, está certo. É muito difícil de ver alguma mudança no desenvolvimento da epidemia.

Pesquisas estimam que, no todo, as restrições de viagens de Wuhan atrasaram o contágio da China por algo entre 3 e 5 dias apenas.

Agora, o quê os pesquisadores pensam sobre como seria o impacto na redução da transmissão?

O bloco de cima é o mesmo que vimos antes. O dois blocos seguintes mostram a diminuição na taxa de transmissão. Se os índices de transmissão abaixam por 25% (através do distanciamento social), isso alinha a curva e atrasa o pico por um total 14 semanas. Abaixe a taxa de transmissão por 50%, e você não verá uma epidemia começando nem menos de 3 meses.

A restrição de viagens vindas da Europa pelo governo americano é boa: Isso provavelmente nos conseguiu algumas horas, talvez um dia ou dois. Mas não mais que isso. Não é o suficiente. Isto é contenção quando o que precisamos é mitigação.

Uma vez que centenas de milhares de casos crescem pela população, prevenir mais casos, acompanhar os existentes e isolar seus contatos já não é mais suficiente. O próximo estágio é a mitigação.

Mitigação

A mitigação necessita de alto nível distanciamento social. Pessoas precisam parar de sair para baixar o nível de transmissão (R), de R= ~2-3 que o vírus segue quando não são tomadas medidas, para abaixo de 1, para que eventualmente acabe.

Estas medidas requerem fechar empresas, lojas, transporte de massa, escolas, reforçar os isolamentos… Quanto pior a situação, mais severo o distanciamento social. Quanto antes você impor medidas severas, menos tempo você precisará mantê-las, o mais fácil é encontrar casos de infusão, e menos pessoas serão infectadas.

Isto foi o que Wuhan teve que fazer. Isso foi o que a Itália foi forçada a aceitar.
Porque quando o vírus fica desenfreado, a única medida é isolar todas as regiões infectadas para poder parar o contágio de uma vez.

Com milhares de casos oficiais – e dezenas de milhares de casos reais – isto é o que países como Irã, França, Espanha, Alemanha, Suíça e Estados Unidos precisam fazer.

Mas eles não estão fazendo.

Alguns estão trabalhando de casa, o que é fantástico.
Alguns eventos estão sendo cancelados.
Algumas regiões afetadas estão em quarentena por eles mesmos.

Todas essas medidas vão diminuir a velocidade do vírus. Elas vão baixar a taxa de transmissão de 2.5 para 2.2, talvez 2. mas elas não são suficientes para baixar para menos de 1 por um período de tempo sustentável para parar a epidemia. E se não pudermos fazer isto, nós precisamos chegar o mais próximo de 1 por quanto tempo conseguirmos, para conseguir alinhar a curva.

Então as perguntas serão: Quais são os tradeoffs (os sacrifícios) que podemos fazer para abaixar o R? Este é o roteiro que a Itália apresentou:

Então dois dias depois, eles adicionaram: “Não, na verdade, devemos fechar todos os estabelecimentos comerciais que não sejam cruciais. Então agora vamos fechar todas atividades comerciais, escritórios, cafés e lojas. Apenas transporte, farmácias e mercados permanecerão abertos.”

Uma abordagem é aumentar as medias gradualmente. Infelizmente, isso dá tempo precioso para vírus se espalhar. Se você quer ficar seguro, faça do jeito Wuhan. As pessoas podem reclamar agora, mas vão agradecer depois.

Como líderes de empresas podem contribuir para o distanciamento social?

Se você é um líder de empresa e quer saber o que deve fazer, a melhor fonte para você é o Staying Home Club.

É uma lista de políticas de distanciamento social que foram determinadas por empresas americanas de tecnologia — até agora, 328.

Eles mudaram de permitido para requerido o trabalho remoto (home office), também restringiram visitas, viagens e eventos.

Ainda há mais coisas que todas as empresas devem determinar, como o que fazer com trabalhadores que batem o ponto, deixar o escritório aberto ou não, como conduzir entrevistas, o que fazer com as copas… Se você quiser saber como minha empresa, Course Hero, lida com alguns desses pontos, junto com um modelo de anúncio para seus funcionários, aqui está o que minha empresa usou.

4. Quando?

É bem possível que até agora você concordou com tudo o que eu disse, e estava pensando desde o início quando tomar uma decisão. Coloque de uma outra forma, quais gatilhos devemos ter para cada medida.

Modelo de Gatilhos baseados em risco

Para resolver isso, criei um modelo (link direto para copiar).

O modelo permite que você acesse o número aproximado de casos em sua região, a probabilidade de seus colaboradores já estarem infectados, como isso evolui com o tempo, e como identificar se você deve se manter aberto ou não.

Ele diz coisas como:

O modelo usa labels (etiquetas) como “company” e “employee”, mas o mesmo modelo poder ser usado para qualquer outro estabelecimento: escolas, transporte público… Se você tem apenas 50 colaboradores em Paris, mas todos vão usar trens, passando por milhares de pessoas, de repente, a probabilidade de que pelo menos um deles seja infectado é muito maior e você deve fechar seu escritório imediatamente.

Se você ainda está hesitando porque ninguém está demonstrando sintomas, lembre que 26% dos contágios acontecem antes de haver sintomas.

Você é parte de um grupo de líderes?

Esta matemática é egoísta. Ela olha para o risco de cada estabelecimento individualmente, assumindo o risco que queremos tomar até que o inevitável martelo do coronavírus feche nossos escritórios.

Mas se você faz parte de um grupo de líderes empresariais ou políticos, seus cálculos não são apenas por uma empresa, mas pelo todo. A matemática se torna: Qual é a probabilidade de qualquer uma de nossas empresas estar infectada?

Se você faz parte de um grupo de 50 empresas de 250 funcionários, em São Francisco, há 35% de chance de que pelo menos uma das empresas tenha um colaborador infectado e 97% de chance de que isso aconteça na próxima semana.
Eu adicionei uma tab (guia) no modelo para brincar com isso.

Conlusão: O custo de aguardar sem fazer nada

Pode parecer assustador tomar uma decisão hoje, mas você não deveria pensar dessa forma.

Esse modelo teórico mostra diferentes comunidades: uma não toma medidas de distanciamento social, uma toma medidas no Dia N de um surto, e uma terceira toma medidas no Dia N+1. Todos os casos são fictícios (Eu os escolhi para se parecer com o que aconteceu em Hubei, com 6mil novos casos diários, na pior das hipóteses).
Eles estão aí apenas para ilustrar a importância de um único dia em algo que cresce exponencialmente. Você pode ver que um dia de atraso para atingir o pico faz muita diferença, para então os casos diários convergirem para zero.

Mas e os casos acumulativos?

Nesse outro modelo teórico que se parece vagamente com Hubei, esperar mais um dia gera 40% mais casos!
Sendo assim, talvez, se as autoridades de Hubei tivessem declarado o isolamento em 22/01 em vez de 23/01, elas poderiam ter reduzido o número de casos em 20mil.

E lembre-se, estes são apenas novo casos. A mortalidade poderia ser muito maior, porque não necessariamente seriam 40% mais mortes. Pois haveria um colapso muito maior no sistema de saúde, elevando o índice de mortalidade em até 10x mais do que vimos anteriormente.
Então, um dia de diferença nas medidas de distanciamento social pode acabar explodindo o número de mortes em sua comunidade multiplicando mais casos e maior índice de fatalidade.

Esta é uma ameaça exponencial. Todo dia conta. Enquanto você está adiando uma decisão por um único dia, talvez não seja questão de alguns casos. Provavelmente já existem centenas ou milhares de casos em sua comunidade. Todos os dias em que não há distanciamento social, esses casos crescem exponencialmente.

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Provavelmente, esta é a única vez na última década que compartilhar um artigo pode salvar vidas. Todos precisamos nos informar e entender o contexto para evitarmos uma catástrofe. O momento de agir é agora.


Tradução do artigo:
ttps://medium.com/@tomaspueyo/coronavirus-act-today-or-people-will-die-f4d3d9cd99ca

Autor original: Tomas Pueyo


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